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20/06/2022 - 10h19

Transporte marítimo do Brasil amarga 104º lugar entre 144 países

Fonte: Portos e Navios
 
Ranking faz parte de um estudo inédito da CNI, que será entregue em conjunto com as “Propostas da Indústria para as Eleições 2022”, aos candidatos a presidente da República. Depois dos avanços nos investimentos privados em terminais portuários do país, instituição acredita que agora é hora de privatizar e modernizar as administrações dos portos públicos.
 
Vistos como principais elos da cadeia logística do setor produtivo brasileiro, os portos são responsáveis por 96% das mercadorias transacionadas – em toneladas – no comércio exterior do país, concentrando um crescente fluxo do transporte via navegação doméstica, de cabotagem e fluvial. Anualmente, eles movimentam mais de 1,2 bilhão de toneladas pelo modal aquaviário que, entre 2010 e 2021, teve uma expansão de 3% no fluxo de cargas, ao ano.
 
Os números até poderiam ser animadores, mas nem passam perto de nadarem em berço esplêndido, levando em conta que, em um ranking com 144 países, o transporte marítimo brasileiro amarga o 104º lugar, ficando atrás somente do rodoviário (116º). Somados ao transporte ferroviário (86º) e aéreo (85º), esses quatro modais colocaram o país em uma incômoda 85ª colocação.
 
Os dados são do “The Global Competitiveness Report 2019” e fazem parte do estudo inédito “Transporte de Cargas: abrindo novos caminhos”, elaborado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e que será entregue, em conjunto, com as “Propostas da Indústria para as Eleições 2022” aos candidatos a presidente da República.
 
Conforme sugeriu a instituição, o Brasil precisa sair dos atuais 0,4% em investimentos no setor de transporte para, no mínimo, 2% do Produto Interno Bruto (PIB), em um “esforço necessário por ao menos duas décadas, para modernizar a logística de transporte do país”.
 
“Uma das consequências do volume insuficiente de investimentos no Brasil é a qualidade ruim da nossa infraestrutura de transportes. A baixa oferta de serviços logísticos e os gargalos encontrados em nossas rodovias, ferrovias, portos e aeroportos são, em conjunto, um dos principais componentes do Custo Brasil, que tanto atrapalha a competitividade do setor produtivo brasileiro”, afirmou o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso, em comunicado à imprensa.
 
Privatização
 
Para o transporte marítimo, a CNI vai propor a privatização das administrações portuárias públicas; implementação do regime de outorgas ao setor privado para gestão de trechos hidroviários; autorização via lei da regulação de preços dos serviços de praticagem pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq); além de avançar em medidas que reduzam o custo e aumentem a transparência dos procedimentos do transporte marítimo internacional.
 
Ao analisar o estudo da CNI, o diretor da FGV Transportes (Fundação Getúlio Vargas), Marcus Quintella, disse concordar com a desestatização. “A privatização das administrações portuárias é importante, começando pela Companhia Docas, que está sendo preparada. Todo esse processo servirá para otimizar e melhorar a gestão administrativa portuária. Na verdade, os portos já são todos praticamente privados, mas estamos falando da administração, da gestão dos portos organizados públicos”, comentou ele à Portos e Navios.
 
Quintella também viu com bons olhos a proposta de implementar o regime de outorgas para o setor privado na gestão das hidrovias, que deveriam ser consideradas tão importantes quanto as rodovias. “Nós precisamos deixar de ter somente rios navegáveis para termos hidrovias, todas balizadas, sinalizadas e com gestão de tráfego. Tudo isso é fundamental para que haja a utilização de toda a potencialidade fluvial que nosso país oferece”.
 
“Essa situação é muito dependente das políticas públicas. O governo brasileiro adotou medidas protecionistas, por exemplo, (no transporte) de cabotagem. As frotas de longo curso ficaram obsoletas no Brasil, não houve incentivo para isso, não foi renovada por falta de competitividade da bandeira brasileira”, criticou.
 
Para o diretor da FGV Transportes, “se não houver investimentos públicos fortes e estruturadores, não haverá desenvolvimento e a nossa situação será a mesma”. “O que não pode é passar o problema para a iniciativa privada, porque ela é complementar, ajuda, entra em programas importantes, mas desde que haja rentabilidade para ela, que não tem esse papel de estruturadora do país”, comentou.
 
Dependência das rodovias
 
Outro ponto do estudo da CNI, que já era do conhecimento de especialistas, é a elevada participação do transporte rodoviário que, excluindo minérios e combustíveis, responde por 86% de toda matriz de transporte do país. Mesmo incluindo esses granéis, que são responsáveis pela maioria das movimentações por ferrovias (minérios) e por cabotagem (combustíveis), os caminhões ainda carregam mais de 60% de todas as mercadorias transportadas no Brasil.
 
“A participação do modal rodoviário, na matriz de transporte brasileira, está acima dos níveis verificados em países de grande dimensão territorial e econômica. Rússia, Estados Unidos, Canadá, China e Austrália apresentam uma participação do modal rodoviário na matriz de transporte de, respectivamente, 8%, 32%, 43%, 50% e 53%”, indicou o estudo da CNI.
 
Para Quintella, da FGV Transportes, “há um grande desequilíbrio da matriz do transporte de cargas no Brasil, em favor do modal rodoviário”. “Nós somos um país altamente dependente do transporte rodoviário, só que também não temos rodovias. Apenas 14% da malha rodoviária nacional é pavimentada e, destes 14%, cerca de 60% está em estado regular, ruim ou péssimo, segundo as pesquisas anuais da Confederação Nacional de Transporte (CNT)”.
 
É possível melhorar?
 
Diante de tantos antigos gargalos e novos desafios relacionados aos quatro modais do país, a CNI questionou se seria possível melhorar a qualidade da malha e superar a dependência do caminhão, para o transporte de cargas em longas distâncias dentro do território nacional. Isso porque a “extensão total das rodovias pavimentadas brasileiras equivale a 5% da malha chinesa e norte-americana, enquanto a densidade de rodovias nesses países é 18 vezes superior à do Brasil”.
 
Acostumada a percorrer as estradas pelo país afora, Elisangela Pereira Lopes, assessora técnica de Logística e Infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), disse que há uma “necessidade de equalização ou melhor distribuição da matriz de transporte brasileira”.
 
Ela ressaltou que, quando se trata do transporte de grãos, por exemplo, 85% de tudo que é movimentado segue pelas estradas. “O uso de linhas férreas ainda é aquém do desejado pelo setor do agronegócio, pois somente 17% de seus produtos são escoados por ferrovias. A maior parte, isto é, 76% são utilizadas pelo minério do ferro. Fora que nossos rios não possibilitam a navegação durante o ano todo”, comentou Elisangela, à Portos e Navios.
 
Nesse sentido, ela afirmou que “as ações (de melhorias para o transporte) devam ser voltadas para agilizar os processos de licenciamentos, elaboração de projetos atrativos aos investimentos privados, aumento da oferta dos modais ferroviário e hidroviário, de maneira a promover a interação com o rodoviário, reduzindo os custos”.
 
Na opinião da assessora técnica da CNA, “como principal produtor de soja e milho, juntamente com os Estados Unidos e Argentina, é importante que nosso país invista nos corredores de exportação e de comércio”. “Nossos custos de transporte superam nossos concorrentes, pelo uso intensivo das rodovias (de 1.000 a 1.500 quilômetros da fazenda ao porto). A Argentina percorre 300 quilômetros até os portos e os EUA utilizam as rodovias para ligar o Rio Mississipi e suas ferrovias. Essa prática resulta em um custo de 30% a 40% menor do que no Brasil”, comparou Elisangela, ressaltando ainda a necessidade de investir em novas fronteiras como os portos do Arco Norte.
 
A especialista ainda mencionou que o déficit de logística no país é decorrente da falta de manutenção e pavimentação das estradas (já que, segundo ela, somente 12,4% delas são pavimentadas); da ausência de investimentos em derrocamento, dragagem, sinalização, implantação de eclusas nos rios, de modo a torná-los navegáveis o ano inteiro; entre outros problemas.
 
“A redução dos investimentos em infraestrutura – em especial na manutenção das estradas –, em relação aos últimos 20 anos, resultou na piora da qualidade das rodovias. Além disso, projetos como o derrocamento do Pedral do Lourenço, no Rio Tocantins, e a paralisação do leilão da Ferrogrão [ferrovia que conectará a região produtora de grãos do Centro-Oeste ao Estado do Pará], pelo Supremo Tribunal Federal (STF), tem resultado na demora dessa equalização da matriz de transporte do nosso país”, ressaltou Elisangela.
 
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