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28/10/2022 - 10h29

O desafio político da crise industrial

Fonte: O Estado de S. Paulo - Editorial
 
Indústria de média e alta tecnologia perde espaço, cenário que qualquer governo deveria trabalhar para reverter
 
O retrocesso industrial, acentuado nos últimos dez anos, cada vez mais visível na balança comercial e negligenciado pelo poder central, será um dos desafios mais urgentes e mais importantes para o próximo presidente, se ele estiver disposto, de fato, a restaurar o desenvolvimento econômico. Um dos sinais mais claros da modernização do País, no último meio século, foi o aumento da presença da indústria nas exportações de bens. Mas esse avanço começou a perder vigor antes da recessão de 2015-2016 e depois disso a crise setorial se tornou indisfarçável, mas o tema permaneceu fora da pauta governamental.
 
De 2018 a 2021 a parcela da indústria de média e alta tecnologia no valor exportado diminuiu de 15,8% para 11,8%. A do segmento de alta tecnologia reduziu-se de 4,7% para 2,2%, segundo análise da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) citada pelo Estadão. A mudança qualitativa no comércio exterior é mais um indício de reversão das mudanças acumuladas depois da 2.ª Guerra Mundial.
 
O saldo comercial tem refletido o recuo do setor. No primeiro semestre, o déficit da indústria de alta tecnologia atingiu US$ 21,1 bilhões, valor 28,6% maior que o de um ano antes. Na indústria de média e alta tecnologia o saldo negativo cresceu 34,6% e chegou, entre janeiro e junho deste ano, a US$ 38,5 bilhões, de acordo com estudo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial.
 
O descompasso entre o Brasil e outros países, no cenário da indústria, tem sido denunciado por empresários nacionais. A participação brasileira no valor adicionado da indústria de transformação global passou de 1,35% em 2019 para 1,28% em 2021, segundo estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) citado pela Confederação Nacional da Indústria. O País tem perdido posições na classificação internacional desde 1996, mas permaneceu nos dez primeiros lugares até 2014. As perdas continuaram e em 2021 a indústria brasileira ficou em 15.º lugar.
 
A expansão e a modernização do setor industrial, especialmente a partir dos anos 1950, envolveram muito mais que enormes investimentos. O avanço da industrialização resultou da ampliação dos canais de financiamento, de políticas setoriais complexas, de uma reforma cambial implantada em 1968, de incentivos fiscais e de um esforço de geração e absorção de tecnologia. Houve acertos e erros. Nem todo recurso destinado ao setor foi bem aproveitado, mas os progressos acumulados em algumas décadas foram consideráveis.
 
A longa fase de expansão e modernização da indústria foi interrompida, no entanto, e os principais fatores explicativos são conhecidos. A economia é muito fechada, o sistema tributário é pouco funcional, os esquemas de capitalização e financiamento são deficientes, falta segurança jurídica e a formação de mão de obra é deficiente – para citar só alguns dos obstáculos mais evidentes. A carência de uma política de desenvolvimento, a partir de 2019, agravou esse quadro, com danos econômicos muito piores que os causados pela pandemia.
 
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